O Advento, que todos os anos a Igreja se propõe viver para preparar o Natal, é um tempo que, pelo seu próprio ritmo e cadência, interpela, provoca e faz crescer. E o momento da história que vivemos está cheio de contextos que interpelam, provocam e pedem caminho. A inesperada pandemia é, neste sentido, como que uma súmula condensada de todos os problemas com que a humanidade e cada pessoa se confronta. É a sociedade no seu todo. É cada uma das pessoas e famílias em busca de melhores condições de vida. São os nacionalismos, os populismos, as curvas do poder e as eleições, a fragilidade da saúde e a evidência da provisoriedade da condição humana, o esgotamento dos recursos do planeta, os refugiados e os pobres ao lado da debilidade das políticas sociais, a educação e a incapacidade para a fraternidade, enfim, um mundo inteiro de desafios. Toda a vida quer viver e ser bem vivida. E há uma dimensão em que a vida humana se diferencia de todas as outras formas de vida: é o apelo e o acolhimento do outro, é o encontro e a relação, é o projeto e a construção.

 

Havia um homem que recebeu de outro um talento, teve medo e escondeu-o. Na mesma hora, outro homem recebeu cinco talentos, e, outro, dois talentos, trabalharam-nos, fizeram-nos render. Cada um destes, conforme as suas capacidades, ganhou o dobro, um, mais cinco talentos, outro, mais dois, cem por cento cada um. A narrativa é parábola evangélica (Mt 25, 14-30). Jesus conta-a, como muitas outras parábolas, não para dar uma resposta fechada como se fosse uma receita, mas para nos interpelar, provocar e fazer ir mais longe. 

 

Estamos, diríamos, entre a expectativa e a desilusão. O Advento é tempo de expectativa. É uma esperança que tem na sua origem, não apenas a dimensão do homem, mas, sobretudo, a Promessa de Deus. É essa Promessa da aproximação de Deus à condição humana que faz gerar e viver a expectativa do encontro com Ele. O fundamento claro da fé cristã não é tocar Deus mas deixar-se tocar por Ele. Ser tocado por Jesus tem sempre o sabor da cura, a marca da sua humanidade, a expressão da sua ternura. Então, claro, há uma diferença entre esconder ou enterrar um talento e trabalhá-lo ou fazê-lo render. A nossa condição humana é um talento para fazer render. 

 

Há expectativas estáticas que nada ajudam a crescer. Há expectativas meramente racionais que isolam as atitudes dos sentimentos. Há expectativas exclusivamente afetivas. Há expectativas que são apenas memórias e se fecham à surpresa do futuro. Há expectativas meramente legais. Mas também há expectativas que interpelam, comprometem, fazem alargar o horizonte, abrem o coração à surpresa da novidade. 

 

E para que não se venha a cair na desilusão do confronto com os talentos enterrados e apodrecidos, é importante questionarmo-nos sobre a realidade em que vivemos. 

 

A família é um dos mais importantes campos em que a expectativa, como atitude própria de Advento, pode ser aprendida, educada, purificada, vivida e ajudar a vida com os seus talentos a dar fruto.

 

Podemos olhar para a família cristã como a força dodom recíproco em amor e dizer que, nela, cada um dos esposos encontra o seu futuro no outro: como sentido de vida, amor, segurança… Mas é igualmente importante afirmar que o amor também se constrói. Seria um erro enorme pensar que o amor, e a própria família, são um instinto, uma disposição natural do coração, sem mais. O amor tem tanto de espontâneo como de realidade a construir com inteligência, com sabedoria-experiência própria e dos outros, com paciência. É por isso que não existe amor nem existe família se cada um dos esposos não tiver vontade de se comprometer, não tiver maturidade para a fidelidade, não for capaz de confiança.

 

De facto, amar é confiar. E comprometer-se é o que salva o amor de se enlear numa valsa – hesitação estéril. É um ato de fé em si, no outro e no próprio amor … é também um ato de esperança. Amar implica comprometer-se num caminho que gera expectativas construtivas porque nem se instala nem fica na hesitação. Então é necessário “desejo”  e “dom”. O amor “exige” sempre a conjugação do desejo com o dom. Na família, o amor dito platónico não serve porque não tem densidade existencial e o amor dito heroico não dura sempre.

É com as bases da comunicação e comunhão, da ternura, da sexualidade libertadora, do projeto comum, da fé, que, no próprio momento da celebração sacramental a família se constrói a partir do batismo e fé, da liberdade, da livre vontade, do amor e respeito, da fidelidade, da intensidade diária de relação, da saúde e doença, tristeza e alegria como horizontes reais da vida quotidiana.

 

O tempo de Advento proporciona a toda a Igreja a vivência da expectativa como construtora do dia a dia mais aberto à presença de Deus. E a todas as famílias, o tempo do Advento vem abrir uma oportunidade de, na expectativa cristã do encontro sempre mais profundo com Jesus Cristo, reconstruir e densificar relações, redefinir prioridades, encontrar momentos comuns de oração, desafiar ao compromisso eclesial e social em favor dos outros, investir valores e tempos na educação dos filhos, participar no cuidado da Casa comum. 

 

Um dos homens que recebeu talentos escondeu-os e perdeu-os. Os outros puseram-nos a render. Tanto talento que o próprio Deus distribui abundantemente pelas nossas vidas para serem cuidados, postos a render e partilhados na alegria e na felicidade.

Um santo Advento para todos!

Para ajudar as famílias a preparar, em Família, a celebração do próximo Natal, apresento-lhe, a Coroa do Advento que o Secretariado Diocesano da Pastoral nos sugere. 

 

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Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 23-11-2020.

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