"Cada novo passo na vida da Igreja é um regresso à fonte, uma experiência renovada do encontro com Cristo ressuscitado", assim começa o documento final do último Sínodo. Não falta quem manifeste grande fastio ao ser desafiado a percorrer os caminhos que ele aponta. Mas, se a fonte é Cristo, se vivemos animados pelo Espírito, se estamos em comunhão eclesial, se permanecemos com Pedro e sob Pedro, qual será a razão de tantos receios? Não será resistência à mudança, tentação comodista, subserviência ao que se pensa e faz, falta de abertura ao que o Espírito vai dizendo ou de confiança naquele que prometeu estar connosco até ao fim dos tempos? Ou será falta de entusiasmo e coragem para tentar novos métodos, nova linguagem, com novo ardor, mais conversação com o Espírito e mais espírito de missão? "Não tenhais medo", disse-nos o Senhor, "não tenhais medo". Porventura, não sabemos nós que os dons que Ele nos deu, aquando do nosso Batismo, são talentos para fazer frutificar e não para enterrar por qualquer motivo? (n.º 141). Talvez que, para alguns, sacerdotes ou leigos, a não atividade se deva ao não acreditarem muito no processo sinodal. Outros, porém, porque há que começar por dar passos simples e discretos e a paciência é pouca, talvez pensem que o melhor seja não fazer nada e depois descansar! Para outros, o pior obstáculo em que tropeçam, se não for o medo de perderem a centralidade que sempre tiveram, ou, de boa ou má vontade, lhe dão por costume, será o de não saberem bem por onde e como começar de forma a gerar empatia e interesse por tal processo. Sabemos que "a sinodalidade não é um fim em si mesma", mas não podemos esquecer que ela é uma dimensão constitutiva da Igreja, faz parte da sua vocação, da sua missão de evangelizar, tendo sempre em conta o sentido da fé da generalidade dos crentes, o qual "não se confunde com a opinião pública". É uma espécie de perceção instintiva que os fiéis têm sobre o que está ou não de acordo com a revelação de Deus em Jesus Cristo.

Alegra-nos, porém, saber que há muita gente a implementar o processo, com alegria e entusiasmo, de forma simples mas persistente. Os participantes no Sínodo admitiram que ele, de facto, já faz parte de muitas das nossas comunidades, que os primeiros frutos já "estão a fermentar na vida das famílias, das paróquias, das Associações e Movimentos, das pequenas comunidades cristãs, das escolas e das comunidades religiosas, onde cresce a prática da conversação no Espírito, do discernimento comunitário, da partilha dos dons vocacionais e da corresponsabilidade na missão" (n.º 7). No entanto, mesmo assim, não deixaram de pedir a todas as Igrejas locais que continuassem "o seu caminho quotidiano com uma metodologia sinodal de consulta e discernimento, identificando caminhos concretos e percursos formativos para realizar uma conversão sinodal palpável nas várias realidades eclesiais" (n.º 9).

Se, como lemos, o documento final delineia os fundamentos teológicos e espirituais destas temáticas, se desenvolve as perspetivas espirituais e proféticas do que emergiu da primeira sessão do Sínodo, se reclama das pessoas a conversão dos sentimentos, imagens e pensamentos, se apela à reforma e à conversão da ação pastoral e missionária, se lembra as relações humanas como construtoras da comunidade cristã e configuradoras da missão, entrelaçando vocações, carismas e ministérios, o documento também identifica três importantes práticas a ter em conta, práticas inspiradas em critérios evangélicos e intimamente ligadas entre si, a saber: ‘discernimento eclesial, processos de decisão e cultura da transparência, da prestação de contas e da avaliação’ (n.º 11). Esta prestação de contas do próprio ministério à comunidade cristã remonta aos princípios da Igreja e deve tornar-se prática corrente, a todos os níveis, inclusive no que diz "respeito ao estilo de vida dos pastores, aos planos pastorais, aos métodos de evangelização e às modalidades como a Igreja respeita a dignidade da pessoa humana, por exemplo, no que respeita às condições de trabalho nas suas instituições" (n.º 98). O próprio Pedro, quando regressou a Jerusalém depois de ter batizado Cornélio, um pagão, teve de prestar contas deste seu ato: "os que tinham vindo da circuncisão começaram a discutir com ele, dizendo: ‘Tu entraste em casa dos incircuncisos e comeste com eles". Pedro não demorou em expor perante eles as razões que o levaram a fazer isso (n.º 95).

A Assembleia sinodal ligou o significado desta transparência "a uma série de termos como verdade, lealdade, clareza, honestidade, integridade, coerência, rejeição da opacidade, da hipocrisia e da ambiguidade, e ausência de segundas intenções", afirmando que, no seu correto sentido, a transparência "não compromete o respeito da privacidade e da confidencialidade, a proteção das pessoas, da sua dignidade e dos seus direitos, mesmo contra pretensões indevidas da autoridade civil. Tudo isto, porém, não poderá nunca justificar práticas contrárias ao Evangelho ou tornar-se um pretexto para contornar ou encobrir ações contra o mal" (n.º 96). A transparência gera confiança e credibilidade, assegura a fidelidade da Igreja à sua missão, faz saber que todos devem prestar contas das suas ações e decisões, que ninguém, seja autoridade ou quem exerce algum cargo ou preste algum serviço, seja membro do clero ou leigo, que ninguém está isento de prestar contas à comunidade ou a alguém, ou a todos.

Perante estas exigências e desafios, embora tenhamos que bater com a mão no peito por muita coisa que se fez ou não se fez e ainda não se faz, não deve haver masoquistas angustiados ou avinagrados. Deve reconhecer-se o que está errado e saltar para o caminho certo, implementando novas práticas, novas formas de ser, estar e agir, abraçando o apelo "à alegria e à renovação da Igreja no seguimento do Senhor, no empenho ao serviço da sua missão, na procura dos modos para lhe ser fiéis" (n.º 3).

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 13-12-2024.

 

 

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