No primeiro século, os cristãos não sentiam a necessidade de celebrar outra festa senão a Festa da Ressurreição do Senhor. Acharam até, que, dada a sua importância, a deveriam prolongar até ao Pentecostes, da Páscoa ao Pentecostes, cinquenta dias como se fossem um único dia de Festa.
Pelo século IV, entenderam celebrar também o nascimento de Jesus. Surge, porém, a questão: em que dia é que Jesus nasceu? Não se sabia nem sabe. Em Roma, celebrava-se a festa do nascimento do deus Sol a 25 de dezembro. Os cristãos, já em grande número, assumem esse dia como o dia do nascimento de Jesus, certos que estavam de que o verdadeiro Sol, a verdadeira Luz do mundo, o Sol que aquece os corações humanos, que favorece o pular da vida e lhe dá significado e sentido, é Jesus Cristo. Aliás, já o primeiro dia da semana em que Jesus ressuscitou, coincidia com o dia dedicado ao deus Sol. Com o andar dos tempos, e porque as circunstâncias o iam reclamando, entenderam que a Festa do nascimento de Jesus também merecia uma cuidada preparação espiritual, aprofundando os aspetos fundamentais da sua pessoa e da sua vida. Assim nasce o Advento, quatro semanas de preparação para a ‘vinda’, a ‘visita’, a ‘chegada’, o ‘advento’, o nascimento de Jesus, o Salvador.
Enquanto se faz esta caminhada espiritual, evoca-se a primeira vinda do Senhor, a verificada em Belém, mas também se evoca a que há de acontecer no fim dos tempos, quando o Filho do Homem vier com grande poder e glória (cf. Mc 13, 26). É verdade que Jesus já veio e há de vir, mas está vivo e presente no meio de nós, está presente em tudo quanto, em cada dia, acontece na nossa vida, na vida do mundo e da Igreja.
O Advento é, pois, este tempo de alegria para os cristãos, um tempo caraterizado pela preparação para um acolhimento mais íntimo e terno da pessoa de Jesus e da sua mensagem. Essa preparação acontece com a escuta da sua palavra, o aprofundamento dos seus gestos salvíficos, a oração mais intensa e confiante, a celebração dos sacramentos da Reconciliação e da Eucaristia, e através de um sério compromisso de conversão ao amor e à paz, de um esforço constante para superar as forças do mal tão aconchegadas no coração humano.
São João Paulo II, dizia que “o Advento se desenhou pela primeira vez no horizonte da história do homem quando Deus se revelou a Si mesmo como Aquele que se compraz do bem, que ama e se dá. Neste dom ao homem, Deus não se limitou a “dar-lhe” o mundo visível – isto é claro desde o princípio – mas, dando ao homem o mundo visível, Deus quer dar-se também a Si mesmo”. Deus “quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tim 2,4). Este “Deus quer”, é exatamente o Advento que se encontra na base de todos os adventos (JPII,13/12/78).
Deus quer! ‘Quem quer o que Deus quer tem tudo quanto quer!’ No entanto, este querer o que Deus quer, encontra, muitas vezes, dificuldades e resistências de várias origens: da fé sonolenta, da vontade débil, da mente endurecida, do coração insensível, da frágil convicção, da ausência de compromisso, do dever sem exigência, do domínio das aparências, do deixa correr, do tanto faz…. Por isso, o Advento convida-nos a avaliar o nosso desempenho nesta aceitação do que Deus quer. E seja qual for a conclusão a que cheguemos, torno presente o que disse o Papa Francisco aos jovens universitários, em Lisboa. Tendo presente ‘todos, todos, todos’, ele afirmou que todos “somos chamados a algo mais, a uma descolagem sem a qual não há voo”, que todos nos devemos preocupar “quando estamos prontos a substituir a estrada a fazer, por qualquer estação de serviço que nos dê a ilusão do conforto”, que todos devemos desconfiar “quando, em vez das perguntas lacerantes, preferimos as respostas fáceis que anestesiam”.
A História da Salvação dá-nos conta da longa e dura preparação do povo de Deus em ordem à primeira vinda do Senhor. Apesar disso, foram tempos de grande esperança e expectativa. Porque Deus é fidelíssimo às suas promessas, vivemos, também nós, nessa esperança e expectativa da sua segunda vinda, sem deixarmos de celebrar a presença do Emanuel, do Deus connosco, do Deus que nos acompanha, nos dá a mão e salva.
Bento XVI afirmava que, no Advento, “a liturgia repete-nos com frequência e garante-nos, quase que a vencer a nossa natural desconfiança, que Deus “vem”: vem para estar connosco, em qualquer situação; vem para habitar no meio de nós, para viver connosco e em nós; vem preencher as distâncias que nos dividem e nos separam; vem para nos reconciliar com Ele e entre nós. Vem à história da humanidade bater à porta de cada homem e mulher de boa vontade, para dar aos indivíduos, às famílias e aos povos o dom da fraternidade, da concórdia e da paz. Por isso, o Advento é por excelência o tempo da esperança, no qual os crentes em Cristo são convidados a permanecer em expectativa vigilante e laboriosa, alimentada pela oração e pelo compromisso efetivo do amor”.
Muitas famílias, sem deixarem de montar o pinheirinho e o presépio, têm por costume fazer a coroinha do Advento. São elementos que, com toda a sua simbologia, se bem entendidos e explicados, favorecem uma certa pedagogia cristã para que toda a família, também com a oração e a escuta da Palavra, possa fazer a sua preparação espiritual para o nascimento de Jesus, o verdeiro presente de Deus à Humanidade.
Descolar da pressão e do ruído consumista, descolar do rame-rame existencial e voar com alegria em direção ao presépio de Belém, abraçando as exigências, a beleza e as surpresas dessa viagem, são os grandes desafios do Advento.
Antonino Dias
Portalegre-Castelo Branco, 01-12-2023.