Portalegre-Castelo Branco, 15-03-2019
Tiago Freitas, jovem Padre da Arquidiocese de Braga, defendeu tese de doutoramento na Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma, com um trabalho já publicado pela Paulinas Editora, e a que deu o título de “Colégio de Paróquias – A paróquia em tempos de mobilidade”. Servindo-me apenas do V Capítulo, pretendo aguçar o apetite para que, sendo lido pelos agentes da pastoral, possa provocar o debate e, se possível, abrir algumas pistas de ação. A pastoral nunca foi fácil. Nos nossos tempos também o não é, mesmo nas paróquias rurais. Não sabendo bem o que fazer e como fazer, todos reconhecemos que a pastoral tem de ser diferente. O Santo Padre, sugerindo-nos algumas pistas, não se cansa de nos apelar à conversão pastoral, dizendo-nos que não podemos deixar as coisas como estão (EG25). Tudo o que vai aparecendo, pois, como fruto de estudo e de reflexão aturada, e com rosto de novidade, é bom que seja apreciado para, se possível, ajudar a encontrar novos caminhos e melhores práticas.
É verdade que o fenómeno da mobilidade atinge o ser humano e as culturas na sua globalidade. E já não há só mobilidade, há mobilidades. Uma moldura de crenças, valores, premissas e técnicas partilhadas pela comunidade oferecem valiosas chaves de leitura. Os fenómenos sociais, culturais e religiosos são transversais à sociedade. Neste mundo assim em mudança e com a mudança sempre a mudar, uma paróquia, mesmo que crave os pés no chão em jeito de solene teimosia do daqui não saio daqui ninguém me tira, não se safa, não se pode renovar pensando e fazendo bem ou melhor aquilo que sempre fez. Os contextos mudaram, a mobilidade social aumenta, as figuras institucionais de referência enfraqueceram, a mobilidade cultural não deixa de acontecer, a mobilidade territorial está cada vez mais facilitada, o êxodo das aldeias para as cidades é constante, as fronteiras geográficas quase se desvaneceram, toda a gente anda por aí a correr para chegar quase sempre tarde … Em face disso, a paróquia territorial também não pode amuar face aos discursos que há muito se ouvem sobre a importância dos lugares antropológicos. Nesta aldeia global, os crentes cruzam-se e confrontam-se com o agnosticismo, o ateísmo, a diversidade de espiritualidades e com formas individualizadas de viver a fé. E surge uma nova imagem de crente, um crente que se contrapõe ao praticante regular, um crente que crê sem pertencer. Um crente com frequência esporádica, com um itinerário de fé que tem como base elementos de outras religiões ou de filosofias de vida, um crente capaz de não se sentir igreja, mas que vem à Igreja reclamar isto ou aquilo. Por estudos feitos, e a título de exemplo, aqueles americanos que se identificam a si como “não-crentes” declaram, por isto ou aquilo, que acreditam na existência de Deus e acabam por ser mais religiosos do que alguns cidadãos da União Europeia que se identificam com grupos religiosos. E vamos lá nós entender isto…
Por isto e muito mais, a paróquia tem de ser rever e cuidar, tem de ser “a presença qualificada, próxima e ministerial da igreja em lugares de particular relevo antropológico e espiritual para, de modo ágil e estável, atingir as periferias humanas e anunciar Cristo”. Segundo o autor: “um hospital, uma escola, uma igreja ou um local de culto são, todos eles, paróquias”. Paróquias onde a comunidade cristã se constitua como um espaço de densidade humana e espiritual, onde se promova uma experiência de afeto e de renovação, onde se produza um efeito de abertura ao transcendente e de encontro com Deus, onde se faça a experiência da fraternidade, onde se ativem itinerários pedagógicos e espirituais que favoreçam a autenticidade da paróquia, onde se respeite o itinerário de fé e maturidade humana de cada cristão, onde haja abertura aos diferentes graus de compromisso e de interesse das pessoas, onde se possa implementar uma pastoral de gestação, isto é, uma pastoral de transmissão, de enquadramento, de acolhimento e proximidade, de proposta e de iniciação, de rosto materno, de boa comunicação da verdade, da mensagem com sentido e presença, em que se faz memória do que se recebeu de Deus e dos outros.
Tiago Freitas apresenta a figura de Colégio de Paróquias como um modelo misto, um modelo que salvaguarda três condições: a existência e integração de pequenos grupos de vida cristã na realidade paroquial; a atenção ao grande número de cristãos anónimos que procuram a paróquia para os sacramentos e acompanhamento espiritual; a criação de espaços e tempos para os cristãos flutuantes, aqueles que, pontual e periodicamente, sentem necessidade de itinerários espirituais. Segundo ele, este modelo fomenta a estabilidade em tempo de mudança, gera vínculos de afeto, de proximidade, de relações humanas de qualidade, de comunhão, favorece a conversão pastoral, reconhece, respeita e abraça a existência de itinerários poliédricos de fé, foge aos percursos pré-formatados e anónimos, olha para o território como um lugar de sentido, não necessariamente geográfico, um lugar de presença significativa nos momentos e espaços onde o amor de Deus precisa de chegar. Tempo e espaço são lugares teológicos, lugares de presença eclesial e divina. Neste modelo, Sacerdotes e leigos partilham de forma mais atenta das prerrogativas cristológicas de serem sacerdotes, profetas e reis pelo batismo. O específico do sacerdote ministerial, do Padre, não é o governo da paróquia, é o ministério da presidência, é oferecer a sua vida pelas ovelhas, acompanhá-las, defendê-las, conduzi-las a boas pastagens, abrindo cada vez mais e melhor as portas à corresponsabilidade e à participação, à colegialidade, para que se atinjam os vários ambientes de vida e serviços eclesiais com a necessária profundidade. O discernimento para ser pastor e guia é um ato comunitário de memória pascal, realizado corresponsavelmente, para edificação da comunidade.
Tiago Fretas e Juan Ambrósio, ambos Professores na Universidade Católica, estarão connosco na Assembleia Diocesana da Pastoral Social e Mobilidade Humana, desta vez na vila de Mação, e sob o tema: “Comunidades Cristãs e Ação Social – O Desafio da Proximidade”.
Antonino Dias